quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Idosos ficam meses internados à espera da família

«Dezenas de idosos vivem nos hospitais sem precisar de cuidados de saúde. As famílias alegam falta de condições para os receber e nos estabelecimentos públicos não há vagas. Em Lisboa, está uma senhora numa cama de hospital desde Julho.

Numa ronda por alguns centros hospitalares do país, a agência Lusa encontrou mais de 30 histórias de utentes que permaneciam internados apesar de já terem tido "alta" clínica. Quando recuperaram, algumas famílias negaram-se a levá-los para casa, desligando telemóveis e dando moradas falsas para não serem contactadas. A maioria, no entanto, mantém uma ligação, visita o paciente e preocupa-se, mas não tem condições em casa para tomar conta do familiar.

Mesmo quando alertados para o perigo das infecções hospitalares, "os filhos continuam a pedir para que os pais fiquem nos hospitais", lembrou Ana Almeida, responsável pelo serviço social do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, onde estão referenciados "seis ou sete casos". A justificação dada pelas famílias é invariavelmente a falta de condições financeiras e de tempo.

Para estas, a única solução que encontram é arranjar vaga na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), uma estrutura lançada em 2006 para prestar "cuidados de saúde e apoio social" a "pessoas em situação de dependência", como define a legislação.

"A Rede fez com que as famílias deixassem de querer levar as pessoas para casa. Antes, como não tinham esta expectativa, acabavam por levá-los, agora dizem que não têm condições", lamentou Manuel Delgado, presidente do Conselho de Administração do Hospital Curry Cabral.

As assistentes sociais usam muitas vezes a RNCCI como "arma" para negociar, garantindo às famílias que a estadia em casa é temporária. No entanto, "muitos não os levam porque desconfiam destas palavras", sublinhou Manuel Delgado.

No extremo estão as famílias que dependem da "magra reforma" do idoso internado. "Sem apoios, sabem que ao levá-lo para casa vão precisar de apoio domiciliário, alimentação, medicamentos, fraldas e, por isso, não o abandonam, mas fazem grande resistência a levá-lo", referiu Ana Almeida.

Manuel Delgado garantiu, no entanto, que este não é um problema exclusivo dos desfavorecidos: "Na classe média também acontece. Não é só por falta de recursos financeiros que se recusam a ficar com o familiar idoso. São pessoas mais egoístas, menos solidárias".

As assistentes sociais "lutam diariamente" contra estas situações. "Há momentos em que desesperamos. Há quatro anos vasculhei tudo porque achava que tinha que haver alguma legislação que obrigasse estas famílias a serem responsáveis", recordou Ana Almeida.

A legislação não obriga a nada e "as assistentes sociais ainda não fazem milagres", ironizou Manuel Delgado, lembrando o caso ainda mais grave dos idosos que vivem sós e não têm alternativa aos serviços públicos. Porque nos hospitais, garante o responsável, "ninguém põe os doentes na rua".

Numa ronda pelos hospitais, a Lusa descobriu 17 idosos com "alta" a viver no Centro Hospitalar de Lisboa Central e outros cinco no Centro Hospitalar do Barlavento Algarvio. Nos hospitais de São João (Porto), Faro e Garcia de Orta (Almada) os responsáveis não avançaram números, mas confirmaram a existência de casos semelhantes.

Fonte: Lusa/Fim, Sílvia Maia

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